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Alzheimer: depois de 30 anos, estudo apresenta nova teoria sobre origem da doença

Pesquisadores descobriram que as placas de proteína consideradas a causa da neurodegeneração são na verdade consequência de um dano neuronal anterior

A teoria da “cascata amiloide”, principal hipótese sobre o desenvolvimento do Alzheimer, é cada vez mais criticada, a ponto de os cientistas se perguntarem se seguiram uma falsa pista na busca por um medicamento nas últimas décadas. Agora, um novo estudo publicado nesta semana na revista científica Nature Neuroscience não apenas coloca em dúvida a tese, como apresenta uma nova origem para a neurodegeneração. Segundo as novas descobertas, a causa seria no interior dos neurônios, e não no exterior.

Apesar de ser a demência mais conhecida e comum no mundo, as causas exatas e o desenvolvimento do Alzheimer seguem desconhecidos pela ciência. Uma das poucas certezas é que as pessoas com a doença apresentam placas de proteínas chamadas beta-amiloides, que se formam ao redor dos neurônios e os destroem.

Esse entendimento é a base da teoria da “cascata amiloide”, que aponta o Alzheimer como consequência da formação dessas placas. Ela serviu como base de pesquisas sobre a doença degenerativa nos últimos 20 anos, mas sem resultados palpáveis. Por isso, essa hipótese gera cada vez mais dúvidas, três décadas depois de ter sido formulada pelo biólogo britânico John Hardy.

O principal questionamento dos cientistas é se as placas representam a causa exata da doença ou se seriam consequência de uma outra patologia. O novo estudo publicado nesta semana, conduzido por pesquisadores do Langone Health, centro médico da Universidade de Nova York, e do Instituto Nathan S. Kline para pesquisa psiquiátrica, ambos nos Estados Unidos, apresenta uma nova hipótese para entender a origem do Alzheimer.

A pesquisa envolveu a análise dos lisossomos das células cerebrais de camundongos geneticamente modificados para apresentarem a doença. Os lisossomos são organelas dentro de cada célula que reúnem enzimas ácidas envolvidas na “digestão” de resíduos metabólicos das reações celulares cotidianas, componentes considerados inúteis ou degradados. Essas organelas são fundamentais, explicam os pesquisadores, para quebrar e descartar partes de uma célula quando ela morre.

Como parte do estudo, os pesquisadores monitoraram a atividade ácida dentro dos lisossomos enquanto as células cerebrais dos camundongos sofriam os danos consequentes do Alzheimer. Os cientistas observaram uma diminuição dessa atividade antes da formação das placas amiloides, uma constatação que pela primeira vez alega um dano nos neurônios anterior ao acúmulo das proteínas.

“Esta nova evidência muda nossa compreensão fundamental de como a doença do Alzheimer progride e também explica por que tantas terapias experimentais projetadas para remover placas amilóides falharam em impedir a progressão da doença. Isso porque as células cerebrais já estão aleijadas antes que as placas se formem completamente fora da célula” explica o autor sênior do estudo Ralph A. Nixon, pesquisador da Universidade de Nova York e do Centro para Pesquisa em Demência, do Instituto Nathan S. Kline.

A pesquisa por si só, embora inovadora, não altera o consenso científico sobre a doença de Alzheimer, uma vez que a hipótese precisa ser confirmada em seres humanos. No entanto, faz parte de um questionamento geral da teoria da “cascata amilóide”, que norteou os esforços da indústria farmacêutica nos últimos anos, possivelmente em vão.

O laboratório americano Biogen desenvolveu o único medicamento autorizado contra a doença degenerativa, mas sua eficácia é questionada pela comunidade científica.

“Nossa pesquisa sugere que futuros tratamentos devem se concentrar em reverter a disfunção lisossomal e reequilibrar os níveis de ácido dentro dos neurônios do cérebro”, defende Nixon.

Casos de Alzheimer aumentam

Um estudo epidemiológico de pesquisadores da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Universidade de Queensland, na Austrália, publicado na Revista Brasileira de Epidemiologia em 2021, mostrou que, até 2050, os casos de Alzheimer podem quadruplicar na população brasileira caso medidas de saúde não sejam adotadas.

Além disso, no último ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) fez um alerta em que afirmou que o mundo está falhando no combate à demência — que tem como uma das principais causas a doença de Alzheimer — e destacou que o diagnóstico pode alcançar 139 milhões de pessoas em 2050.

fonte: https://oglobo.globo.com/saude/medicina/noticia/2022/06/alzheimer-depois-de-30-anos-novo-estudo-apresenta-nova-teoria-sobre-origem-da-doenca.ghtml